terça-feira, 29 de abril de 2014

Manifesto De Stijl

NEOPLASTICISMO
Primeiro manifesto
De Stijl (1918)
1. Há dois conhecimentos dos tempos: um antigo e um novo. O antigo se dirige para o individualismo.
O novo se dirige ao universal.
A luta do individual contra o universal se revela tanto na guerra mundial quanto na arte de nossa época.
2. A guerra destrói o mundo antigo com o seu conteúdo: a dominação individual sob todos os pontos de vista.
3 A arte nova atualiza o que está contido no novo conhecimento dos tempos: proporções iguais do universal e do individual.
4. O novo conhecimento dos tempos está prestes a se realizar em tudo, mesmo na vida exterior.
5. As tradições, os dogmas e as prerrogativas do individualismo (o natural) se opõem a esta realização.
6. O objetivo da revista de arte De Stijl é apelar para todos aqueles que acreditam na reforma da arte e da cultura para aniquilar tudo o que impede o desenvolvimento, do mesmo modo que fizeram no campo da arte nova suprindo a forma natural que contraria a própria expressão da arte, a conseqüência mais alta de cada conhecimento artístico.
7. Os artistas de hoje tomaram parte na guerra mundial no domínio espiritual, impelidos pelo mesmo conhecimento contra as prerrogativas do individualismo: o capricho com todos aqueles que combatem espiritualmente ou materialmente para a formação de uma unidade internacional na Vida, na Arte e na Cultura.
8. O órgão De Stijl, fundado com esse fim, dispende todos os seus esforços para tornar clara a nova idéia da vida. A colaboração de todos é possível pelo: envio do nome, endereço, profissão à nossa redação, como prova de assentimento; contribuições (críticas, filosóficas, arquiteturais, científicas, literárias, musicais, etc., assim como reproduções fotográficas) para o periódico mensal De Stijl; tradução em todas as línguas e publicação das idéias publicadas em De Stijl.
Assinatura dos colaboradores:
Theo van Doesburg, pintor/ Robt van´t Hoff, arquiteto/ Vilmos Huszar, pintor/ Antony Kok, poeta/ Piet Mondrian, pintor/ G. Vantongerloo, escultor/ Jan Wils, arquiteto.
Segundo manifesto Neoplasticista
De Stijl 1920
A literatura
O organismo da literatura contemporânea vive ainda do sentimentalismo de uma geração debilitada.
A palavra está morta
Os clichês naturalistas e os filmes dramáticos de palavras que os fabricantes de livros fornecem aos metros e aos quilos não contêm nenhum dos novos aspectos de nossa vida.
A palavra impotente
A poesia asmática e sentimental — o eu e o ele — que é perpetrada em toda parte e principalmente na Holanda está sob a influência de um individualismo temente do espaço. resíduo fermentado de um tempo velho e que nos enche de tédio.
A psicologia na nossa literatura romanesca repousa apenas na imaginação subjetiva; a análise psicológica e a retórica confusa mataram a significação da palavra.
Essas frases cuidadosamente colocadas uma após outra e uma debaixo da outra, essa fraseologia seca na qual os realistas antigos apresentavam suas experiências limitadas a si mesmos, são inteiramente impotentes e não podem exprimir as experiências coletivas de nosso tempo. Seguindo a antiga concepção da vida, os livros se baseiam no comprimento, na duração, são volumosos: a nova concepção da vida reside na profundidade e intensidade e assim queremos a poesia.
Para construir literariamente os múltiplos acontecimentos em tomo de nós, é necessário que a palavra seja reconstituída ao mesmo tempo como som e como idéia. Se na antiga poesia, pela dominação dos sentimentos relativos e subjetivos, a significação intríseca da palavra foi destruída, queremos por todos os meios ao nosso alcance —a sintaxe, a prosódia, a tipografia, a aritmética, a ortografia— dar uma nova significação da palavra e uma nova força à expressão.
A dualidade entre prosa e poesia não pode subsistir; a dualidade entre o conteúdo e a forma não pode subsistir. Então, para o escritor moderno, a forma terá uma significação diretamente espiritual, ele não descreverá nenhum acontecimento, não descreverá nada: escreverá.
Recriará na palavra o coletivo dos fatos: unidade construtiva do conteúdo e da forma. Contamos como apoio moral e estético de todos aqueles que colaboram na renovação espiritual do mundo.

Leyden-Holanda, abril 1920 Theo van Doesburg/Piet Mondrian/Aniony Kok

Terceiro Manifesto Neoplasticista
Para a formação do novo mundo
A concentração espiritual (Cristo) e a concentração material (Capitalismo) formam no antigo mundo o eixo em torno do qual o povo evoluiu. Mas eis que o espírito se dispersou. Apesar disso, os portadores do espírito estão solidários. Interiormente. Não há mais saída para a Europa. Concentração e possessão, o individualismo espiritual e material eram as bases da antiga Europa. Ele está bloqueado por dentro. Não pode mais se livrar. O perigo é fatal.
Observamos tudo tranqüilamente; mesmo se estivesse em nossas mãos intervir, não interviríamos. Não pretendemos prolongar a vida dessa prostituta.
Divisamos uma nova Europa. As ridículas 1a., 2a., 3a. Internacionais Socialistas foram apenas barulho superficial, brilho de palavras. A Internacional do espírito interior, intransponível em palavras. Longe de ser uma redundância vocabular constitui atos plásticos e força vital interior. Força de espírito. Assim faz o esquema do novo plano do mundo. Não fazemos nenhum apelo aos povos: reuni-vos ou juntai-vos a nós. Sabemos que os que se juntarão a nós já juntos estavam, de origem, pelo espírito. Só para estes será modelado o corpo espiritual do novo mundo.
Trabalhai.

Quinto Manifesto Neoplasticista
De Stijl (1923)
Para ama construção coletiva

I. Trabalhando coletivamente, examinamos a arquitetura como unidade criada de todas as artes, indústria técnica, etc., e descobrimos que a conseqüência disso será um novo estilo.
II. Examinamos as leis do espaço e suas variações infinitas (isto é, os contrastes de espaço, as dissonâncias de espaço, os complementos de espaço, etc.) ... e descobrimos que todas essas variações do espaço devem ser governadas como uma unidade de equilíbrio.
III. Examinamos as leis da cor no espaço e na duração e descobrimos que as relações equilibradas desses elementos dão enfim uma unidade nova e positiva.
IV. Examinamos a relação entre o espaço e o tempo, e descobrimos que o aparecimento desses dois elementos através da cor produz uma nova dimensão.
V. Examinamos as relações recíprocas da medida, da proposição, do espaço, do tempo e dos materiais, e descobrimos o método definitivo de construí-los como uma unidade.
VI. Pelo rompimento da caixa fechada (os muros, etc.) acabamos com a dualidade do interior e do exterior.
VII. Damos à cor seu verdadeiro lugar na arquitetura e declaramos que a pintura separada da construção arquitetural (isto é, o quadro) não tem nenhuma razão de ser.
VIII. A época da destruição está totalmente superada. Uma nova época começa, a da construção.


Paris 1923 Van Eesteren / Theo van Doesburg / G. Rietveld.

segunda-feira, 28 de abril de 2014

Tunga em obras: Brasileiro, que estará na próxima Bienal de SP, abre nova exposição em galeria de Nova York

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES - DE NOVA YORK
Na semana passada, a galeria Luhring Augustine, no bairro de Chelsea, em Nova York, abriu suas portas para uma nova exposição do brasileiro Tunga, intitulada, em francês, "La Voie Humide" (a via úmida).
Nova, no caso, tem sentido especial: é a primeira apresentação de um conjunto de obras que se destaca da produção anterior do artista -- embora mantenha, naturalmente, relações com a sua rica e já longa trajetória.
"É claro que a gente não consegue não ser a gente mesmo", diz ele, que completa 62 anos em outubro.
"Mas depois de um momento que eu considero de síntese da minha obra, eu achei por bem tentar recomeçar", afirma.
"À diferença do que vinha fazendo antes, me lancei em algumas aventuras completamente às escuras, ou melhor, ofuscado por um excesso de luz, um sentimento muito poderoso. Essas coisas acontecem porque a gente está vivo. A tarefa de um artista, de um poeta, é também a de estar atento a essa possibilidade de se transformar continuamente."
Das 11 esculturas e dos 14 desenhos em exibição até 31 de maio, emerge uma poética mais luminosa, construída a partir de um novo repertório de materiais e desenvolvida de maneira pouco usual na carreira do artista.
A começar pela presença de peças moldadas à mão, que foram se configurando não a partir de um projeto fechado, mas ao longo de sua própria feitura.
"Eu pus a mão na massa, literalmente. Comecei a trabalhar com terracota, a esculpir e modelar", conta.
"Deliberadamente me coloquei nesse retorno ao fazer com a mão. Sem nenhum elogio a isso, mas com a ideia de que aquilo que a mão fala é fundador. Quando você se volta para o fazer com a mão, você de algum modo se reencontra com o arcaico, com as matrizes."
A terracota é apenas um dos materiais presentes nas esculturas --tripés de ferro que sustentam um arranjo de peças. O artista também usou, entre outros, resinas, goma arábica, borracha, gesso, panos, bronze, pérolas e tubos de vidro com mercúrio.
Ele considera que a escolha de novos materiais reflete, por si, um modo de pensar, e que traz embutida "a expressão de uma certa alegria", que também se traduz "na presença clara de uma cor um pouco híbrida, de começo de dia, de praia antes do sol nascer" --em contraste com fases mais "escuras"-- de seu trabalho.
"Creio que a mudança radical que se operou na minha vida foi perceber que há mais mistério na vida, na luz, do que na morte", resume.
ESPELHO
Tanto as esculturas quanto os desenhos contêm referências explícitas --e implícitas-- ao corpo, mas numa fase particular, que se relaciona com a noção psicanalítica do "estágio do espelho".
"Para um bebê", explica ele, "o corpo nesse estágio é percebido como formações sucessivas, configuradas segundo ordens da natureza e do desejo. São partes que se fundem, se soltam, se moldam, se ligam umas às outras e também a coisas exteriores, como o seio materno, a luz ou os ruídos".
Mecanismo similar corresponde ao princípio de construção das novas obras, que conectam elementos diversos num mesmo conjunto --ou num mesmo corpo.
Tunga acredita que a experiência infantil do "corpo expandido" pode ser experimentada em fases posteriores da vida através do amor.
"Falo do amor como a excelência do que eu chamo de energia de conjunção, aquela energia capaz de fazer com que de dois elementos surja um terceiro. Os três, formando uma tríade, são uma unidade e uma coisa nova."
Ele vê, ainda, nos seus novos trabalhos, um caráter de "oráculo". "Também pelo fato de remeterem a um modo de pensar relacionado ao arcaico, eles trazem essa característica. É quase como se você pudesse perguntar a eles sobre a natureza de uma pluralidade de coisas e eles pudessem te responder --caso você esteja aberto para as respostas."
Convidado para a próxima Bienal de São Paulo, Tunga afirma que pretende explorar a ideia de oráculo de maneira talvez mais explícita, criando uma relação "quase que interpessoal" da obra com o público.
"O trabalho ainda está em fase de preparação, mas posso adiantar que, ao contrário da ideia de monumentalidade que a Bienal evoca, eu vou numa direção quase intimista, embora em grande escala", diz.

LA VOIE HUMIDE
QUANDO de ter. a sáb., das 10h às 18h; até 31/5
ONDE Luhring Augustine, 531 West 24th street, tel. (1) 212-206-9100, Nova York
QUANTO grátis
www.canotusbrasil.blogspot.com

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quarta-feira, 23 de abril de 2014

ANDRÉ VAINER E MARCELO FERRAZ: Outra vez o Masp


A crise é sobretudo de credibilidade. Vemos uma contabilidade de números de visitantes usada como defesa diante da falta de ousadia
A crise por que passa o Masp (Museu de Arte de São Paulo) está relacionada ao desmonte sistemático de um projeto artístico e conceitual celebrado como uma revolução no mundo dos museus.
É também a falta de reconhecimento aos seus criadores. Após a saída do professor Pietro Maria Bardi da direção, o Masp vem erraticamente caminhando, ora com mostras "blockbusters", ora no lamento da falência financeira.
Mas sempre no sentido oposto aos ideais de seus criadores: Assis Chateaubriand, o "aventureiro" realizador, Pietro Maria Bardi, o talentoso caçador de obras-primas, e Lina Bo Bardi, a revolucionária arquiteta. Esses nomes vêm sendo apagados pouco a pouco, esquecidos.
A crise não pode ser tomada apenas no seu aspecto financeiro. Se fosse assim, uma boa campanha de arrecadação entre os associados a resolveria. No passado, o professor Bardi em vários momentos botou a mão no bolso para manter as portas do Masp abertas. Hoje, muitos querem ajudar, mas com o dinheiro público de renúncia fiscal, por meio da Lei Rouanet.
A crise do Masp é sobretudo de credibilidade. O museu se fechou para a sociedade artística e intelectual e para os produtores culturais. Daí a dificuldade no diálogo com município, Estado e União. Estes e mais algumas instituições como o Instituto Bardi, a USP e a Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) deveriam ter seu assento no conselho. Afinal, apesar de pertencer a uma sociedade privada, ninguém tem dúvida de sua natureza pública, enquanto patrimônio tombado.
Os princípios fundadores do museu estão na arquitetura de espaços livres, acessíveis e generosos, abrigo de criadores de vanguarda; centro cultural com uma das maiores coleções de arte do Ocidente. Qualidade, inteligência e ousadia guiaram seus criadores e dirigentes por décadas. Hoje, vemos uma contabilidade de números de visitantes usada como defesa diante da falta de ousadia. Lina costumava dizer: "Os supermercados também estão lotados. Isso é sucesso?".
São pontos altos do projeto o vão-livre e a museografia de cavaletes de concreto e vidro, que Lina chamava de "painéis didáticos de cristal". Tocar nesses temas desagrada a muitos, mas clarifica a falta de reconhecimento de seus criadores e o fechamento do museu em si mesmo.
O vão-livre, um ninho de aconchego urbano, de tempos em tempos é ameaçado. Mas isso nunca vingará: as reações contrárias são contundentes. Dois pisos acima, porém, o fechamento do museu está em marcha desde 1996, com a extinção da libertária museografia de Lina.
Pessoas com menos de 25 anos não conheceram a coleção de obras expostas como uma grande família. Ao contrário, o que se vê hoje é uma expografia mais afeita aos palacetes europeus, com salinhas e labirintos, fruto de visão colonizada. Mataram a grande sala de exposições. A proposta de Lina era a quebra total de modelos expositivos e, gostando ou não, não poderia desaparecer. Deveria ser guardada como experiência radical e única. Andamos para trás.
Neste ano, comemoramos o centenário de Lina. É uma oportunidade de recuperarmos sua museografia. Mais do que uma homenagem, seria um gesto de respeito aos frequentadores, que merecem conhecer esse ousado projeto em sua plenitude. E, quem sabe, um primeiro passo para o museu voltar a dialogar franca e abertamente com toda a sociedade.

terça-feira, 15 de abril de 2014

Mostra exibe vestido, espartilho e prótese de Frida Kahlo

No México, museu expõe vestuário que ficou trancado no banheiro da casa da artista 50 anos após sua morte
FERNANDA EZABELLACOLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DA CIDADE DO MÉXICO
Por 50 anos, o banheiro do quarto de Frida Kahlo permaneceu trancado após sua morte, na casa onde hoje funciona um popular museu na Cidade do México. O espaço só foi aberto há dez anos, revelando diversos baús de objetos íntimos, como cartas, fotografias e vestidos coloridos.
Enquanto as correspondências viraram livros sobre a artista mexicana, seu guarda-roupa e suas fotos vão aos poucos chegando ao público. É o caso de duas mostras em cartaz na capital mexicana e na Califórnia (EUA).
Mais de 300 peças de vestuário são exibidas até setembro na residência de Kahlo, apelidada de Casa Azul, em salas que mudam os figurinos a cada três meses.
"Ela usava estes vestidos tradicionais para fortalecer sua identidade, reafirmar suas crenças políticas e para esconder suas imperfeições", diz a curadora Circe Henestrosa. "Seus amigos mais íntimos contam como Kahlo tinha um cuidado especial ao escolher o que vestir, dos pés à cabeça, com as mais lindas sedas, laços, xales e saias."
A exposição traz também aparatos médicos que a artista precisava usar por conta de suas doenças (primeiro pólio e depois um acidente num ônibus). Há uma prótese de perna com uma bota de cano alto vermelha e um espartilho feito de gesso, decorado com uma foice e um martelo.
Já a terceira sala tem objetos curiosos como um vidro de esmalte pink e adereços de cabeça. Outros espaços exibem vestidos de alta costura, como Gautier e Givenchy, inspirados na pintora.
Em 1937, seu estilo a colocou nas páginas da "Vogue". A revista ajudou na organização da mostra e anunciou um livro em parceria com o museu, a ser lançado na América Latina neste semestre.
PINTURAS E FOTOS
Foi o muralista Diego Rivera (1886-1957), marido de Kahlo (1907-1954), que havia dado as ordens para manter o banheiro fechado por 15 anos após a morte da artista. Mas a mecenas Dolores Olmedo (1908-2002), amiga íntima de Rivera que tinha ciúmes de Kahlo, conseguiu manter o lugar lacrado por mais tempo.
Olmedo, maior detentora de obras dos dois artistas, tem um museu próprio na periferia da Cidade do México. Em março, abriu uma exposição com centenas de pinturas da dupla que estavam em itinerância havia dois anos.
Outro lugar para ver as raridades do banheiro da Casa Azul é o Museu de Arte Latino-Americana de Long Beach (Califórnia), que exibe mais de 200 fotografias tiradas por Kahlo e de Kahlo. Há lembranças de família, como retratos da artista aos seis anos, e imagens de amigos famosos como Man Ray (1890-1976).
"É como sentar em sua sala de estar e folhear seu álbum de fotos. É muito pessoal", disse o presidente do museu, Stuart Ashman. A mostra abriu com um concurso de sósias e tem programação extensa com palestras e atividades até junho.
Folha, 15.04.2014